Perto do Coração por Laura Marcus/Planet Syndication ilustração de José Moreira
Tirando partido das armas que hoje se encontram à nossa disposição, podemos vencer a distância e manter viva a chama do amor.
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Como é que se mantém o amor verdadeiramente vivo quando somos obrigados a estar separados? Longas e fumegantes sessões de sexo pelo telefone podem ajudar, claro, mas é preciso muito mais do que uma respiração quente e ofegante para manter as coisas… enfim, quentes. O que é preciso então fazer mais?
Conseguiria aguentar uma relação em que quase nunca visse o seu parceiro, em que o contacto estivesse reduzido a e-mails, mensagens escritas e caríssimos telefonemas de longa distância, e em que o tempo que passassem juntos fosse sempre curto, com despedidas longas e lacrimosas?
A maioria das mulheres - à excepção daquelas que são tão fóbicas em relação a compromissos que só querem uma relação semidistante - não escolheria um cenário destes. Recearíamos que a falta de proximidade acabasse por matar os sentimentos. E temeríamos que o traba-lho de tentar manter o casal unido, apesar da distância, exercesse uma tal pressão sobre ambos que, por fim, um dos dois procuraria, com alívio, alguém mais perto de casa. Não será seguramente o maior temor em relação a um amor duradouro o velho ditado "Longe da vista, longe do coração"? Quem pode ter a certeza do que o seu parceiro, à distância, anda a fazer quando não está connosco?
É nesta situação que muitas mulheres acabam por se encontrar. Pode acontecer que a empresa o transfira para um lugar numa cidade distante - ou que seja ela a transferida. Ou talvez se tenham encontrado nas férias, ela ache que ele é o homem da sua vida e simplesmente não consiga pôr fim à relação quando regressa a casa. Mantêm-se, assim, em contacto, pensando que as coisas ficarão por aí. Mas as semanas transformam-se num mês, e este em vários, e sem se dar conta, ela vê-se a economizar dinheiro desesperadamente para a passagem de avião para o rever, ou vice-versa.
"Vem sair connosco, diverte-te um bocadinho", insistem os amigos. Mas ela só quer ficar em casa para lhe mandar e--mails, ou para o ver e falar com ele pelo computador, ou para lhe telefonar. Não suporta estar "separada" dele e, no entanto, é sempre assim que está.
Algumas mulheres sentem-se mais atraídas por este tipo de relações que outras? É possível, na opinião da psicóloga Anna Newman. "Para além do elemento romântico da troca de correspondência, dos telefonemas escaldantes até altas horas da noite e das mensagens e e-mails diários, há algo de muito atractivo numa relação com uma pessoa que raramente se vê. Nunca tem de se lidar com aquelas coisas chatas do dia-a-dia, como de quem é a vez de arrumar a cozinha ou decidir que vídeo se vai ver ao serão. A relação é sempre excitante, sempre vivida a alguma distância. E é como viver eternamente os primeiros momentos do amor - uma forma de permanecer naquele estádio inicial em que as pessoas se vão conhecendo e apaixonando. Pode ser inebriante."
Além disso, é hedonístico. Significa inevitavelmente viver apenas para o presente e pode parecer muito mais empolgante do que as relações bastante vulgares que os nossos amigos têm.
Lidar com o amor à distância Você será capaz de viver uma relação à distância?
Sim, se: - Tiver uma boa vida social em que se apoie enquanto ambos estão separados. - Adorar escrever, seja e-mails, mensagens ou cartas, ou através da Internet. - For suficientemente extrovertida para estar horas ao telefone. - Gostar da aventura e não se importar de não ter uma relação convencional. - Apreciar a ideia de sexo telefónico/on-line.
Provavelmente não, se: - Precisar do apoio constante de alguém que esteja por perto. - O ciúme a assaltar facilmente e se convencer de que ele tem outra lá longe. - Não tiver a certeza de poder ser fiel a alguém que raramente vê. - Não tiver muitos amigos ou grande vida social, transformando o seu amor no centro da sua vida - embora isto não seja saudável para uma relação. - Tiver dificuldade em falar ao telefone, detestar escrever e ainda não tiver descoberto como é que se enviam mensagens escritas.
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A empresa onde Maria trabalha ofereceu--lhe recentemente uma promoção que implicava a mudança para uma localidade a 320 quilómetros de distância - e a 320 quilómetros de Roberto, o seu namorado. "Estive quase para não aceitar, porque não suportava estar longe dele. O facto de ele querer que eu aceitasse também não ajudou. Porque será, pensei eu?" Talvez Roberto quisesse o me-lhor para Maria e considerasse injusto atravessar-se no caminho dela.
Sue Wood, terapeuta familiar, pensa ser frequente as mulheres na situação de Maria terem dúvidas sobre a sobrevivência da sua relação a uma separação porque, à partida, já não estão absolutamente seguras. "As relações podem funcionar e funcionam quando há uma separação. A solução é tirar o melhor partido disso. Há muitos casais que o fazem com êxito. É possível ter as duas coisas, não é preciso escolher entre a carreira e o amor. Vejo muitas mulheres que procuram aconselhamento que desejariam ter tido oportunidades como a de Maria, em vez de terem assentado demasiado novas. Quem não quiser tornar-se uma delas, tem de arriscar. Caso contrário, nunca saberá qual seria o seu futuro."
Portanto, se lhe oferecerem uma oportunidade fantástica - ou a ele - e a única coisa que a impede de aceitar é o medo da separação, deve pelo menos experimentar, sugere Sue Wood. Caso contrário, a dúvida permanecerá para sempre.
"As coisas estão a correr razoavelmente", comenta Maria. "Mas não é fácil. Não é como nenhum de nós desejaria que fosse. Quando estamos habituados a ver uma pessoa praticamente todas as noites, ou a saber que ela está ali perto se precisarmos de um mimo, por exemplo, é bastante penoso vermo-nos de repente a 300 quilómetros de distância. O facto de já termos uma relação bastante forte ajuda, mas estamos a fazer planos para ele se mudar para ao pé de mim. Lamento, mas esta coisa do amor à distância não é para mim. Os longos telefonemas custam uma fortuna, e as constantes viagens de regresso na maior parte dos fins-de-semana são esgotantes."
Não devemos partir do princípio de que os casais afastados não conseguem manter a relação, afirma o psicólogo clínico Simon Gelsthorpe. "O simples facto de uma pessoa pensar que a sua relação não sobreviverá a um afastamento não quer dizer que tal aconteça. Eu viraria isto ao contrário e perguntaria de onde vem essa convicção. Talvez essa pessoa tenha visto fracassar a relação de um amigo que passou por uma experiência semelhante, e presuma que lhe vai acontecer o mesmo. Ou talvez tenha tido uma experiência em criança que a leve a pensar que não pode ter uma relação à distância. Por que não? Quem disse que era assim? Questionar os nossos sistemas de convicções ajuda-nos a ver as coisas de um ângulo completamente diferente."
E acrescenta: "Ainda que se tenha tido uma relação no passado que se desmoronou quando uma das pessoas se mudou para longe, isso não significa que outra relação à distância tenha o mesmo desfecho. A mudança de um dos membros do casal pode tornar mais difícil sustentar a relação. Mas já pensou que, nalguns aspectos, também pode facilitá-la? Por exemplo, pode reduzir a pressão. Talvez invista menos nesta relação, como único meio de se sentir feliz, e mais noutros aspectos da sua vida. O que constitui, seja como for, uma forma muito mais saudável de se relacionar com uma pessoa do que depender totalmente dela para a satisfação de todas as suas necessidades. Por conseguinte, aconselharia fosse quem fosse a experimentar, pelo menos, e ver o que acontece. Pode funcionar muito melhor do que se pensa."
Será mais fácil quando uma relação começa logo por ser à distância do que já ter uma relação que, a dada altura, passa a ser à distância devido a uma separação forçada?
Estarmos separados de alguém que nos habituámos a ver sempre que queríamos pode ser um choque terrível - embora alguns casais se dêem bem com algum distanciamento e vejam com agrado a oportunidade de, como sugere Simon Gelsthorpe, desenvolver outras vertentes das suas vidas. Mas será mais fácil quando uma relação nasce à distância?
Júlia decidiu nunca mais se envolver com alguém quando, inesperadamente, tirou umas pequenas férias para visitar uma amiga que vivia longe, na província. "O meu coração foi novamente destroçado por um malandro, e precisava de me afastar para me recompor. Conhecer outra pessoa não só não se incluía nos meus planos como eu estava absolutamente determinada a nunca mais ter um namorado." Mas a amiga apresentou-a inocentemente ao Miguel, só para compor o grupo numa saída à noite e... Júlia apaixonou-se à primeira vista. E o Miguel por ela. "Foi como se nos co-nhecêssemos desde sempre. Foi aquele instante mágico. Extraordinário."
Durante cinco dias e cinco noites, foram absolutamente inseparáveis. Quando chegou o momento de Júlia apanhar o avião de volta, prometeram manter o contacto. Ela não sabia bem se cumpriria a promessa. E duvidava bastante que ele o fizesse.
"Quando voltei a casa, porém, já tinha uma mensagem dele à minha espera no atendedor de chamadas - e isso fez toda a diferença. Passámos a trocar mensagens escritas, e-mails, a conversar ao vivo na Internet e a ter as mais incríveis e escaldantes sessões de sexo telefónico até de madrugada", conta Júlia.
Glossário
SMS. Mensagens via telemóvel. Para tórridas, mas curtas, declarações de amor, pois o número de letras é limitado: 160.
E-mail. Para cartas românticas de envio rápido. Basta obter um e-mail através do seu provedor de Internet ou dos portais nacionais e estrangeiros que facultam este serviço sem custos.
Conversas on-line. Conversas (escritas) privadas em tempo real. Para falar de amor ou mesmo de sexo, com o apoio de pequenos (e gratuitos) programas como o ICQ (www.icq.com) ou o Yahoo Messenger (messenger.yahoo.com).
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O sexo por telefone. Será uma condição para manter as coisas a funcionar num romance à distância? "Não necessariamente. Acho que se pode sobreviver sem isso, mas devo dizer que me ajudou realmente a sentir que estava com ele, que continuávamos juntos. E manteve-nos até ao encontro seguinte", confessa Júlia.
"O sexo telefónico significa também que usamos muito a imaginação e que expandimos a relação de formas que, de outro modo, nem sonharíamos. Passava o dia todo no trabalho a pensar no telefonema que ele me faria à noite. Era tão excitante, tão atrevido... Sendo ambos solteiros, nada nos impedia de estar juntos. Mas há algo de ilícito no sexo telefónico. Recomendo-o. Dá cá um frisson..."
Embora nenhum deles pudesse dar-se ao luxo de fazer visitas frequentes, revezaram-se nas deslocações de avião às respectivas cidades para passarem fins-de-semana compridos e férias juntos. No resto do tempo, era telefone, mensagens escritas, e-mails e conversas on-line. Como é que nos governávamos antes das novas tecnologias? E, contudo, a capacidade humana de amar, de manter vivo o amor independentemente dos obstáculos, é lendária.
Sempre houve relações à distância mantidas por cartas, sonhos, esperanças e recordações. A Internet, as mensagens escritas, o correio electrónico e o telefone apenas tornam as coisas mais fáceis e acessíveis, mas o desejo de amar à distância sempre existiu. E uma vantagem da troca de correspondência constante - quer se utilize o SMS, o e-mail ou o cor-reio tradicional - é que se pode conhecer alguém de um modo que nunca aconteceria numa relação mais convencional.
Esperanças, sonhos, desejos, fantasias, histórias, tudo pode ser discutido indefinidamente. Não existe aquela preocupação com o "ele não fala comigo", porque o diálogo constitui 90 por cento da relação. Se não forem capazes de falar um com o outro, a relação não sobreviverá à distância.
"Não sei se o Miguel e eu poderemos alguma vez viver no mesmo sítio ao mesmo tempo. Espero que sim, muito embora, se alguma vez dermos esse passo, seja impossível dizer se as coisas vão funcionar quando estivermos no mesmo sítio o tempo todo", diz Júlia. E talvez seja aqui que está a chave.
É a distância que os mantém juntos ou será ela um obstáculo à verdadeira união pela qual ambos anseiam? Só o estarem sempre juntos pode responder a esta pergunta. Mas, cuidado... algumas pessoas preferem mesmo a distância e descobrem que, a partir do momento em que podem ver o ser amado sempre que quiserem, a magia desaparece. Não é forçoso que assim seja... mas é possível.
"Naturalmente, espero que não seja esse o caso comigo e com o Miguel. Elaborámos planos para o futuro e, quando conseguirmos finalmente estar juntos, será de uma forma muito realista, fazendo coisas de que todos os casais estáveis gostam, como aninharmo-nos em frente de um DVD com uma refeição pronta. Todas as relações são um risco, e suponho que temos as mesmas probabilidades que a maioria das pessoas de levarmos a nossa para a frente. Faço tenção de tentar, isso é certo", conclui Júlia.